Da série: Diálogos com Deus – Deus e o ateu
– Quem é você?
– Sou seu pai, e pai de todos aqui nesta Terra?
– Adão? George Bush?
– Não meu, filho, sou Deus…
– Que deus o caramba! Não acredito nestas baboseiras!
– Não precisar acreditar. Não preciso da tua crença para existir, assim como um elefante voador cor-de-rosa não precisa que tu acredites na existência dele para existir…
– Mas… Espera aí? São possíveis elefantes voadores cor-de-rosa?
– Vou te responder da seguinte forma: para saber se algo existe ou existiu de verdade, tens que ter estado aqui desde o começo dos tempos e ao mesmo tempo em todos os lugares, pada poder presenciar tudo que existe. Do contrário nunca saberás se elefantes voadores cor-de-rosa são possíveis.
– Sim, mas isto é impossível!
– Não é não! Lembre-se que só Deus é onipotente, onipresente e onisciente. Mas, como não acreditas em mim, não te dou a resposta do elefante! Tchau!
Resenha do livro Memórias de um anarquista japonês, de Osugi Sakae
A história (real) de Osugi Sakae (com uma sublinha acima do O) se passa no fim do século XIX e adentra o século XX. É um retrato do início do movimento socialista e anarquista no Japão. Sakae Osugi, como o chamaríamos no Brasil, descreve em 7 capítulos desde suas primeiras lembranças, sua infância, sua juventude como filho de militar, sua vida na Escola de Cadetes e após sua expulsão da mesma, recorda a vida e a morte de sua mãe e finaliza sua autobiografia com relatos de sua vida na prisão, descrevendo as várias passagens pelo sistema penitenciário japonês.
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O livro, escrito como um “diário de lembranças”, como toda autobiografia, consegue ser bastante rico em detalhes em trechos interessantes para Sakae como por exemplo nos instantes de baderna e brigas de gangues de sua juventude; quando lembra de sua gagueira e como ela piorava com a ansiedade; das duas brincadeiras amorosas infantis e de suas “experiências sexuais individuais”(esconde entretanto detalhes e apenas insinua ter tido algumas experiências homossexuais); suas numerosas mudanças de residência em função do trablho do pai e de residências queimadas (várias!); sua desilusão com todo e qualquer tipo de aprendizado imputado, exceto o de línguas; sua facilidade para os esportes; sua indignação e as injustiças do sistema hierárquico militar; sua prazerosa paixão pela liberdade; seu adquirido gosto pela poesia e pelas leituras anarquistas; seu otimismo socialista; sua vida na prisão.
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Do ponto de vista de estética de linguagem, o livro é como esta resenha: bastante pobre, mas quando avaliamos seu valor como documento histórico e colocamos ao lado de nossa ignorância ocidental a respeito dos movimentos revolucionários japoneses, adicionamos um pouquinho de gosto de história, temos um prato cheio para degustar.
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É curioso perceber que, justamente na prisão, Osugi se torna um anarquista e isso acontece justamente porque é lá que ele tem mais tempo para estudar e para se definir politicamente.
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Alguns dos trechos mais interessantes encontramos no posfácio da obra (não estou de gozação!), onde é transcrito um diálogo entre Sakae e Goto Shimpei (ministro do interior do Japão), quando Osugi invadiu um jantar na casa desse exigindo dinheiro para uma nova revista anarquista já que o governo censurava e apreendia cada uma das revistas que ele criava. Veja só o diálogo:
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“Goto: Mas eu ouvi que o senhor tem uma boa cabeça e braços fortes. Por que então está em dificuldades?
Osugi: Porque o governo obstrui nossos negócios.
Goto: W por que o senhor vem pedir dinheiro para mim em particular?
Osugi:
Já que o governo está nos atrapalhando, eu acho que é lógico que eu venha pedir dinheiro ao governo. Acho que o senhor irá entender este meu pedido.
Goto: Ah, sim… Quanto você quer?”
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Concluindo: Sakae ganhou 300 ienes com os quais lançou uma nova revista, pagou uma dívida com uma das amantes, deu dinheiro para a esposa e para a outra amante e ainda lhe sobraram 20 ienes para uma viagem de férias!
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O mais interessante é que, depois de ler 170 páginas escritas por Osugi Sakae, passar pelas primeiras 56 com uma certa impressão de “putz, botei dinheiro fora” e acabar gostando do livro, do que mais gostei foi mesmo do posfácio, escrito por Rogério de Campos, que resume a vida de Osugi após 1910 até 1923, ano de seu assassinato pela Polícia Militar Japonesa.
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É lá que o contexto histórico é resumido e colocado em um painel onde sentimos a importância de Osugi Sakae para a sociedade japonesa da época: na sua rebeldia inclusive nas assembléias e reuniões da esquerda, onde ficava incomodando os palestrantes; em sua defesa do feminismo e do amor livre, que chocou a opinião pública e de intelectuais japoneses.
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Vemos as conseqüências do grande terremoto de 1923, que destruiu Tóquio e Yokohama, danificando 73% de todas as casas e destruindo completamente 63% delas. Avaliamos que, em decorrência do caos instalado, surgiu a oportunidade ideal para atacar líderes sindicais, comunistas, socialistas e anarquistas, ocasião em que Osugi, Ito, sua amante e um sobrinho foram assassinados pela Polícia Militar.
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Após este episódio, a repressão foi acentuada e tornada cada vez mais brutal, e acabou evoluindo para uma marcha acelerada rumo à total militarização da sociedade japonesa que culminou na Segunda Guerra Mundial.
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Osugi influenciou as revoltas estudantis dos anos 60 (no Japão!), onde novamente as idéias de combater a repressão política, econômica e sexual e de lutar contra toda forma de hierarquia estava de volta, trazendo a lembrança do “Anarquista Erótico” – como ficou conhecido.
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Para finalizar (Continue lendo.), um de seus textos, de fevereiro de 1918, chamado “Quanto a mim, prefiro o espírito“:
“Eu gosto do espírito. Seja como for, geralmente detesto quando o espírito é transformado em teoria. Detesto porque nessa passagem para a teoria, ele freqüentemente se torna servil, um colaborador em harmonia com a realidade social presente. Porque isso é uma fraude. Eu odeio o que os cientistas políticos e filósofos chamam democracia e humanismo. Fico doente só de ouvi-los. Eu odeio o socialismo também. E pela mesma razão, eu odeio um pouco o anarquismo. O que eu mais gosto é a ação cega da humanidade: a explosão de espírito.”
Quem chegou até aqui e leu o texto inteiro, parabéns! Pode colocar o dedo aqui e dá um alô ali nos comentários!
PS: Os “Excertos e comentários do livro Transparências da eternidade, de Rubem Alves” fico devendo para o próximo pôust, já que a notícia de que, apesar de ter sido liberado pela Aeronáutica, fui convocado ontem para servir no Exército, em Santa Maria, uma cidade a 320 km de Porto Alegre. Ainda nem sei o que vai ser do Simplicíssimo e do Escrever Por Escrever… Talvez me rebele, torne-me um insubmisso, vá preso e escrevo minhas “Memórias do Cárcere” e, ao sair, um ano após publique um livro contando minha história e ganhe milhões… Hmmm… Até que não é uma má idéia…
Outra: em função das mudanças no Blogger.br, acabei transportando todo o Escrever Por Escrever para este endereço aqui, que é o espelho do site sem as fotos… Assim que tiver um tempo dou uma guaribada por lá e arrumo a casa!
Próximos pôusts: “Da série: Diálogos com Deus – Maria vai a feira”, “Sistema de cotas nas universidades brasileiras: solução ou vergonha?” e “Excertos e comentários do livro Transparências da eternidade, de Rubem Alves”