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Hoje é dia de crítica cinematográfica. Deixei de comentar 21 gramas e Adeus Lênin vistos no cemeço do ano, mas não vou deixar passar esses dois:

O sorriso de Mona Lisa

Bom filme. Sei que não se começa uma crítica assim, mas isso é passado e vamos logo às explicações.

Ìamos ver “O último Samurai” e, por decisão de minha namorada, que ouvira falar deste filme -onde uma professora vai a um colégio conservador e tenta mudar suas alunas-, decidimos – juntos – assisti-lo prioritariamente (sem muita expectativa, como é de se esperar e como deveria ser, para evitar grandes tombos – todos já aprendemos!).

Depois do início lento do filme, característica imanente de grande parte dos dramas, passamos a perambular por nuances humanas de várias gradações: encontramos o protótipo da mulher ideal da sociedade norte-americana da década de 50, jovem casada com sua dedicação total ao matrimônio; a jovem solteirona “que ninguém quer” que encontra seu amado e os percalços de sua vida de recém-amante; a jovem fácil e fogosa que além de apaixonada pelo professor faz de sua vida um jogo com vários homens; a brilhante jovem que tem sua chance de seguir carreira naquilo que escolheu mas deixa o sonho de lado pela imagem idealizada de um futuro com marido e filhos; e a professora subversiva – Julia Roberts – inicialmente encantada com toda pompa e circunstância da escola Wellselley e depois desiludida pelo excesso de rigidez e conservadorismo, ao descobrir que a escola não formava líderes e seres pensantes, mas sim boas donas-de-casa.

O ponto chave do filme certamente diz respeito ao título do filme ( poderia ser diferente?) em que é feito um questionamento de suma importância: o que importa realmente: o que somos e sentimos ou o que parecemos ou demonstramos sentir? Através do sorriso do quadro Mona Lisa, desenvolve-se uma crítica àquela sociedade estabelecida, onde as mulheres submetiam-se aos desejos da sociedade machista – com o auxílio mesmo de suas mães – sendo muitas vezes o retrato de uma mulher que, em público, transparecia satisfação quando em verdade, em sua vida íntima, estava quebrada em fragmentos. Seu ser desejante era impiedosamente massacrado pelo estabelecido e pouco restava de sua essência.

Mona Lisa estará sorrindo ou parece estar sorrindo? Somos realmente aquilo que demonstramos ou também usamos máscaras?

Bom filme.

Eu fui ver ” Mansão Mal-Assombrada”!

Era uma quinta-feira comum, a não ser pelo fato de que pela manhã iria trabalhar em Novo Hamburgo, das 10:00 às 14:00 e à tarde seguiria para São Leopoldo, cidade vizinha, para trabalhar das 16:00 às 20:00.

Por um desejo macabro não consigo imaginado e impetrado por quem, acabaram por não marcar meus pacientes em Novo Hamburgo. Pronto! Era só o que faltava! O que faria eu das 10:00 às 15:00? Voltar para Porto Alegre? Com o absurdo preço da gasolina? Nem pensar! Só havia uma solução: atravessar a rua e me esbaldar no Shopping Center. Foi o que fiz.

Depois de perambular por todo shopping, cansei os olhos e as pernas. Afinal de contas, meus cromossomos são XY e não XX (estes últimos conferem uma resistência absurda para longas aventuras em locais como shopping-centers, feiras de fábrica ou qualquer lugar onde estejam expostos roupas e sapatos). Comprei algumas revistas e resolvi sentar na Praça de Alimentação, para ler e esperar a fome chegar. Com a fome, veio uma idéia: por que não comer algo e passar as próximas duas horas no cinema, assistindo um filme? Boa idéia! Lá fui eu!

Almocei e me dirigi de pronto em direção ao cinema. Para meu pesar, só poderia assistir a um filme que estava sendo exposto no horário das 13:00: Mansão Mal-Assombrada. Ei, mas espera aí: comédia com Eddie Murphy! Deve ser bacana! (até aquele momento, não havia visto ou lido nenhum comentário acerca do filme, e fui com tudo comprar meu ingresso!).

Comprei meu ingresso, uma pipoquinhas e refrigerante e, quando faltavam dez minutos para o filme fui para a fila. Na fila, começou a bater o pavor. Na minha frente, meia dúzia de pré-adolescentes entre 12 e 13 anos. Atrás de mim ia se formando uma fila parecida, com exceção de um casal de jovens adolescentes entre 16 e 17 anos. Começou a vir um calor, que depois se transformou em frio e percorreu toda minha espinha, alojando-se em algum lugar entre a boca do meu estômago e minha testa, não podia definir bem.

A moça que pega os ingressos começo seu trabalho. Naquele momento, caminhando em direção à sala de cinema, me sentia qual gado indo para o matadouro. Já nem pensava mais no dinheiro gasto nem no tempo perdido, apenas na minha burrice. Note-se aqui uma forte carga de preconceito e também uma expectativa negativa criada pelo público assistente, diferente do meu grupo etário.

Para meu alento, vi entrarem na sala mais 3 adultos, sendo que um era um gigante que entrou com aqueles kits de pipoca gigante e refrigerante gigante (sozinho) e mais duas senhoras que acompanhavam suas filhas. O que ainda me deixava (um pouco) tranqüilo é que o filme tinha censura (12 anos, mas tinha!).

Quanto ao filme, bem, não foi tão ruim assim, mas, a não ser que realmente não tenha mais nada a fazer, não assista. Explico: quase não damos risadas, não é nem um pouco engraçado para um filme com Eddie Murphy e classificado como comédia além do mais, conta uma história decididamente esgotada por contos de fadas e histórias mil que ouvimos desde a infância.

Não cheguei a entrevistar criança alguma na hora da saída, mas não havia nem empolgação quanto menos excitação nos seus olhos ao sair da sala de cinema. Mas, colocam dinheiro fora em tanta coisa, não é mesmo Melhor que seja com algo que se aproxime de cultura. Mastigada, repetida e normalizada, mas cultura.

Rafael Reinehr é médico endocrinologista, anarquista, escritor, permacultor, ativista oikos-socio-ambiental e polímata ma non troppo.

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