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Che Guevara e seus novos modelos de boina

Antes de mais nada preciso dizer aos amigos da Esquerda que estamos do mesmo lado! Antes de qualquer atitude mais exaltada, saibam que esta é apenas uma brincadeira no Photoshop. Tenham por certo que Guevara não estaria se revirando no túmulo e sim dando risadas desta piada.

Agora sim, podemos seguir adiante. Se ainda assim a indignação permanece, tentem ler o texto abaixo sobre Norberto Bobbio e vejam como ele se auto-define ao fim do texto. Se mesmo assim continuares indignado, acho que precisas de umas aulas de yoga ou um retiro nas montanhas, coisa do gênero!

Perdemos Norberto Bobbio

Morreu anteontem, aos 94 anos, Norberto Bobbio, um dos principais filósofos políticos do século XX.

A despeito de ser socialista, não deixava de reconhecer os méritos do pensamento liberal, negando assim a crença maniqueísta de que todo o bem esteja de um lado e todo o mal de outro.

Autor de 50 livros sobre política, filosofia e direito, o professor emérito da Universidade de Turim e Senador vitalício, nascido a 18 de outubro de 1909, Bobbio estudou direito e filosofia e foi professor universitário e jornalista.

Entre suas idéias encontravam-se a “desconfiança de uma política excessivamente ideologizada que divide e exclui; a defesa do governo das leis contra o governo dos homens; a opção pelo laicismo como exercício do espírito crítico contra os dogmatismos opostos dos católicos e dos comunistas.”

Autobiografa-se como alguém de “nascimento em família burguesa, os estudos habituais de um rapaz de boa burguesia citadina, liceu clássico e universidade, vida sedentária transcorrida em grande parte entre as quatro paredes de um escritório, ou nas mais diversas bibliotecas do mundo, salvo algumas viagens para participar de congressos ou proferir conferências, um casamento feliz e vida familiar serena, vida pacífica num dos períodos mais dramáticos da história européia”.

Adepto da máxima de que “no meio está a virtude” – lembrando o pensamento taoísta – Norberto era um pessimista de mão cheia, agnóstico e inclinado a “achar as razões da dúvida mais convincentes do que as da certeza”, dizia viver como leigo em um mundo que ignorava a dimensão da esperança.

Para se auto-definir, usava um trecho que certamente resume todo seu legado de sabedoria e nos inspira a seguir seu exemplo:

“Aprendi a respeitar as idéias alheias, a deter-me diante de segredo de cada consciência, a compreender antes de discutir, a discutir antes de condenar. E já que estou em veia de confidências, faço uma ainda, talvez supérflua: detesto os fanáticos com toda a alma”.

(sintetizado e adaptado a partir da página A10 da Folha de São Paulo de 10/01/2004, a partir de textos de Renato Janine Ribeiro e Rubens Ricupero)

A impossibilidade do SUS – o possível do impossível (parte II de II, a princípio…)

A gratuidade do Sistema Único de Saúde Brasileiro (SUS) está com seus dias contados. O que falta? Iniciativa para mudar uma situação que já beira o insustentável.

Não existem bolsos públicos do tamanho necessário para manter a UNIVERSALIDADE e a INTEGRALIDADE que constituem o cerne do SUS.

A solução que se apresenta seria a de cobrar pela utilização da rede pública de saúde, desde a consulta médica, odonto ou psicológica, até os exames diagnósticos ou tratamentos oferecidos.

Tal ônus seria proporcional à condição econômica do favorecido e se daria até mesmo àqueles sem as mínimas condições de pagar qualquer centavo. Ficariam isentos de custo tão somente as atividades de prevenção primária à saúde, tão negligenciadas atualmente por profissionais e mesmo pacientes ¿ e maiores responsáveis pela diminuição da incidência de enfermidades.

Para dar seqüência ao meu pensamento, transcrevo o editorial da edição 34 do Jornal Virtual Simplicíssimo, onde a idéia está posta de forma clara e breve com exemplos):

“Dia desses estava conversando com um amigo sobre o SUS. Isso, o “Sistema Único de Saúde” brasileiro. Desde os idos da década de 80 que essa utopia tenta se estabelecer. Sem sucesso. Aparentemente, cada vez mais aumenta a tecnologia necessária para o bem tratar do paciente, pois nossos incansáveis cientistas descobrem mais e mais formas de descobrir antes, ver melhor e também tratar mais adequadamente as doenças. Não é preciso dizer que toda essa melhoria que cresce vertiginosamente tem um custo. Que também cresce vertiginosamente! Fora dos parâmetros possíveis de serem abarcados por um sistema de saúde que busca ser universal (para todo e qualquer cidadão brasileiro), integral (da mais simples consulta médica e do pedido de hemograma até o mais elaborado PET scan ou angioressonância disponíveis) e gratuito.

Se a tecnologia não pára de se desenvolver, a qualidade da saúde possível de ser oferecida também não, e, ora, os custos acompanham este acréscimo de qualidade, nada mais justo do que pagar por todo esse novo conhecimento! É utópico, atualmente, conceber um sistema público de saúde que seja responsável por todo e qualquer gasto de toda a população de um país do tamanho do Brasil!

A proliferação da busca por planos privados de saúde é somente um dos sinais dessa insuficiência. Mas como então podemos resolver o problema desta saúde que anda tão capenga?

Em primeiro lugar, toda e qualquer consulta deveria ter um valor, um custo para o paciente, mesmo que simbólico. Isso evitaria, entre outras coisas, o que ocorre todos os dias em nosso sistema de saúde: consultas por frivolidades, ocupando a vez de quem realmente necessita; marcações desenfreadas para todo e qualquer tipo de especialista sem a devida avaliação ( o paciente só buscaria auxílio se realmente estivesse necessitando (sabemos que hoje não é assim) e assim por diante. O mesmo valeria para exames. Hoje, como os exames não são pagos, boa parte das pessoas nem se interessa por saber qual exame está sendo realizado. Vai consultar no clínico no Posto de Saúde em fevereiro e este lhe pede um hemograma, glicose, colesterol e triglicerídeos. Como estava com dor no peito, pede encaminhamento ao cardiologista, no Hospital A, que lhe pede uma glicose, colesterol e triglicerídeos, além de um eletrocardiograma. O paciente leva os exames ao clínico que diagnostica diabete e encaminha o paciente ao Endocrinologista. Chegando ao Endócrino no Hospital B, este solicita uma glicose, colesterol, triglicerídeos, já que o paciente não lembrou de trazer os exames nem sabe direito por que está consultando com aquele médico. Isso acontece TODOS os dias, acreditem! TODOS os dias!!!

Claro que um sistema informatizado integrado poderia resolver este último problema, mas mesmo assim, não há dinheiro público suficiente para açambarcar toda saúde da nação. Aí você vai dizer: e se o Zé Ninguém, pobre de marré de si, que mora na Rua do Sobe e Desce, número que não aparece, que não tem onde cair morto acaba caindo na Emergência do Hospital, vomitando sangue pelas orelhas depois de ter tomado todas e mais algumas, o que fazer? Cobrar como dessa figura? Tiramos-lhe as calças cagadas? De forma alguma! Este paciente precisa ser realmente ajudado! Seu problema é principalmente social. A este, se o Estado não ajudar, a morte vai logo logo pegar. Este pode ser supervisionado por uma equipe de médicos comunitários, auxiliado por uma assistente social e, inclusive, pensar em pagar seu atendimento com algum serviço voluntário. Pôxa, mas ele não tem dinheiro nem pra cachaça quanto mais pra pensar em fazer serviço voluntário! Aí é que você se engana! Para quem não ganha migalha, um serviço “voluntário” que ofereça residência temporária, alimentação e vestimenta é uma “baita mão na roda”. Mas o que você está dizendo: o mendigo bebum vai trabalhar pro governo? É isso aí que estou dizendo!!! O cara morava na rua, bebia até vomitar o fígado. Agora ele vai pra uma casa comunitária mantida pelo governo, vai ter uma assistente social lhe ajudando, orientação e supervisão de uma equipe composta por, no mínimo alguns médicos comunitários, psicólogos e voluntários e vai ser, ele mesmo, um voluntário. Pode ajudar a limpar os parques da cidade, pode ajudar na cozinha da casa comunitária, pode ajudar- depois da barba feita e de uma orientação – a cuidar de crianças em uma creche comunitária. Utopia? Menor do que a de um sistema público universal integral e gratuito de saúde pública!

A idéia é essa. Todos temos que colaborar com o Sistema Único de Saúde para que ele realmente possa beneficiar a todos, integralmente e de forma verdadeiramente efetiva. Não devemos ter vergonha em aceitar que não estamos ainda prontos para realizar nosso sonho. A idéia do SUS continua sendo, em essência, fenomenal e única. O momento, infelizmente, ainda não chegou. Hora de retroceder para ganhar fôlego. Só assim sairemos deste buraco que estamos nos enfiando e nos aproximaremos do conceito de saúde pregado pela Organização Mundial da Saúde: “Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não meramente a ausência de doença ou enfermidade”. . Até lá!”

Uma Tentativa de uma Breve Análise Sócio-Psicológica das Letras de “Admirável Chip Novo”, “Máscara”, “O Lobo” e “Do Mesmo Lado”, de Pitty

Para realizar esta valorosa e curiosa tarefa resolvi convidar algumas pessoas, às quais agradeço inestimavelmente pelas idéias geradas e divididas. Essas pessoas são: Maurício Silveira dos Santos, Lia Shulz, Luciane Kessler e Carolina Schumacher, que de ontem à tardinha até o surgir da noite, sentados comigo em um bar na Rua da República se dedicaram à tarefa – entre uma e outra amenidade – de fazer uma avaliação crítica de algumas músicas desta surpreendente cantora brasileira.

Pitty na verdade é Priscilla Leoni, tem 25 anos, nasceu na Bahia e, no meio de todo aquele axé conseguiu sair uma verdadeira musa do rock brazuca.

Passo agora a transcrever a letra de 4 de suas músicas (todas de autoria da própria Pitty) seguida de uma breve análise sócio-psicológica de suas letras. As fotos foram retiradas do site oficial da Pitty.

Admirável Chip Novo

Pane no sistema alguém me desconfigurou

Aonde estão meus olhos de robô?

Eu não sabia, eu não tinha percebido

Eu sempre achei que era vivo

Parafuso e fluído em lugar de articulação

Até achava que aqui batia um coração

Nada é orgânico é tudo programado

E eu achando que tinha me libertado

Mais lá vem eles novamente e eu sei o que vou fazer:

Reinstalar o sistema

Pense, fale, compre, beba

Leia, vote não se esqueça

Use, seja, ouça, diga

Tenha, more gaste e viva

Não sinhô, Sim sinhô, Não sinhô, Sim sinhô

A música sugere que estamos atravessados por uma confusão entre nossa identidade humana e nossa identidade máquina. Afinal, vivemos em tempos onde o mundo todo é governado por máquinas, desde automóveis, trens ou aviões mas também computadores, caixas-registradoras, celulares e CD-players.

No momento em que refere “nada é orgânico é tudo programado”, além da visão óbvia vinda de um robô que achava que era gente e se descobre robô, temos justamente a visão contrária, oferecida por Félix Guattari: de que na verdade somos humanos normalizados pelo Capitalismo Mundial Integrado, as forças sociais instituídas como Escola, Igreja, meios de comunicação de massa que produzem seres humanos com individualidade embotadas, que querem as mesmas coisas, tem os mesmos objetivos de consumo ou ideais de vida. Na frase “e eu achando que tinha me libertado”, podemos lembrar destas forças que a todo custo tentam minar nossa humanidade, tentando nos trazer de volta à “normalização”, à ausência de singularidade.

No refrão “pense, fale, compre, beba…”, temos imperativos categóricos que demonstram o aspecto acima referido dos meios de comunicação de massa e também das outras instituições tentando – mesmo de forma adolescente – “prescrever um comportamento”.

No fim (“não sinhô, sim sinhô, não sinhô, sim sinhô”) podemos ter uma visão pessimista – de que tudo permanecerá igual e somente o que devemos fazer é acenar com a cabeça baixa e seguir como bonecos manipulados – ou, como prefiro, uma visão otimista de que temos capacidade de responder à altura e nos libertar das opressões e das “falsas necessidades” que são geradas em nós pelo meio em que vivemos e que somos estimulados.

Máscara

Diga quem você é, me diga

Me fale sobre a sua estrada

Me conte sobre a sua vida

Tira

A máscara que cobre o seu rosto

Se mostre e eu descubro se eu gosto

Do seu verdadeiro jeito de ser

Ninguem merece ser só mais um bonitinho

Nem transparecer… consciente ou inconsequente

Sem se preocupar em ser adulto ou criança

O importante é ser você

Mesmo que seja estranho, seja você

Mesmo que seja bizarro, bizarro, bizarro

Meu cabelo não é igual

A sua roupa não é igual

Ao meu tamanho, não é igual

Ao seu caráter, não é igual

Não é igual, não é igual…

Esta música é justamente uma ode à produção da diferença, da singularidade que referíamos acima.

Ela também faz alusão às máscaras sociais que muitas vezes devemos criar para podermos nos bem comunicar no meio profissional, familiar mas que na verdade não representam o verdadeiro eu, ou nossa “essência”. Pitty canta em favor deste verdadeiro eu que deve se apresentar em todas as circunstâncias para gerar relações verdadeiras entre os seres e não entre nossas máscaras.

Quando canta: “meu cabelo não é igual, a sua roupa não é igual, ao meu tamanho, não é igual, ao seu caráter, não é igual…” nos lembramos que somos realmente diferentes, pessoas com intelectos, idéias, corpos, formas de agir e pensar diferentes mas que muitas vezes (e cada vez mais) tendemos a pensar e a agir de forma monotonamente mecanizada e repetitiva, novamente uma crítica à produção massificada de indivíduos iguais pelo Capitalismo Mundial Integrado (Félix Guattari).

O Lobo

Houve um tempo em que os homens

em suas tribos eram iguais

Veio a fome e então a guerra

pra alimentá-los como animais

não Houve tempo em que o homem

por sobre a terra viveu em paz

Desde sempre tudo é motivo

pra jorrar sangue cada vez mais

O homem é, o lodo do homem, o lobo

O homem é, o lodo do homem, o lobo

Sempre em busca do próprio gozo

e todo zelo ficou pra trás

Nunca cede e nem esquece

o que aprendeu com seus ancestrais

Não perdoa e nem releva

nunca vê que já é demais

Em “O Lobo” temos uma visão interessante do homem como o “bom selvagem” de Rousseau, como podemos aferir do início da música “houve um tempo em que os homens em suas tribos eram iguais”. Esta era a época do Estado de Natureza com uma auto-organização suficiente.

Já no refrão, a idéia que se passa é diferente: depois de algum tempo vivendo em harmonia, criou o homem a guerra e fez jorrar sangue, lembrando Hobbes e sua idéia de que o homem é egoísta por princípio e que o mundo não satisfaz suas necessidades, defendendo que no Estado Natural haveria necessariamente competição pela riqueza, pela segurança e pela glória.

Da passagem “sempre em busca do próprio gozo e todo zelo ficou pra trás” podemos fazer várias interpretações:

A primeira delas através de uma leitura zen: a busca eterna da satisfação, o desejo infinito – quando conseguimos algo, queremos algo mais infinitamente, Deveríamos nos livras desta busca constante pelos objetos de nosso desejo. Para Lacan a única forma de vivenciar um estado de não-desejo seria a Morte.

Para Gilles Deleuze e Félix Guattari o “gozo” referido expressaria-se através de um desejo de produção – produção de arte, de matéria, de dinheiro.

Também podemos fazer , da mesma sentença uma alusão ao atual governo norte-americano, que, além de não assinar o Tratado de Kyoto pela redução dos poluentes atmosféricos justificando simplesmente que isso iria reduzir a produção industrial americana, também volveu guerra contra o Iraque sem justificativa cabível.

Do Mesmo Lado

Quem chegou a ouvir o som?

Quem ligou se não tá no tom?

Quem não viu e mesmo assim falou?

Quem tomou e não gostou?

Quem dividiu o tudo em dois?

Quem preferiu deixar pra depois?

Quem escolheu o bem e o mal?

Quem achou que tudo é normal?

E eu tô do mesmo lado que você

E eu tô no mesmo barco que você

Então pensa, ouve e vive a música

Quem chegou a ouvir o som?

Quem ligou se não tá no tom?

Quem não viu e mesmo assim falou?

Quem tomou e não gostou?

Quem partiu a Terra ao meio?

Quem decidiu o que era feio?

Quem acreditou no “tudo bem”?

Quem confiou em alguém?

E eu tô do mesmo lado que você

E eu tô no mesmo barco que você

Então pensa, ouve e vive a música

Esta música abre-se a numerosas interpretações. De uma forma geral, ela fala de solidariedade, busca uma lógica holística, plural e que, por isso mesmo induz à contradição – lembrando o pensamento complexo de Edgar Morin.

“Quem preferiu deixar pra depois?”- lembra um hábito muito presente nas sociedades ocidentais urbanas: o da procrastinação. Acabamos por empurrar as coisas com a barriga sempre para a última hora quando devemos faze-lo correndo para tender o prazo solicitado.

“Quem escolheu o bem e o mal?” – lembra o maniqueísmo a que muitos ainda somos afeitos e também levanta a questão taoísta do caminho do meio, a busca do equilíbrio entre o bem e o mal.

“Quem não viu e mesmo assim falou?” – lembra novamente a busca de armas de destruição em massa no Iraque, que apesar de não existirem foram o motivo para a invasão e destruição do país.

“Quem decidiu o que era feio?” faz lembrar Nietsche em seu questionamento sobre quem havia decidido quais os valores de nossa forma de viver.

Bem, é isso! Poderíamos ter desenvolvido mais idéias pois a fertilidade desta terra que são as letras da Pitty são enormes. Essa foi a primeira de uma série de “Tentativas” que irei fazer com auxílio de amigos nos mais variados bares de Porto Alegre. Até a próxima!

PRÓXIMOS PÔUSTS: a decidir

Rafael Reinehr é médico endocrinologista, anarquista, escritor, permacultor, ativista oikos-socio-ambiental e polímata ma non troppo.

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