Urgência das Ruas – Black Block, Reclaim The Streets e os Dias de Ação Global
ANTES DE MAIS NADA…
Surgindo na Inglaterra no início dos anos 90 a partir da luta antiestradas, uma das características do Reclaim The Streets (RTS) tem sido uma autocrítica severa, algo realmente inspirador e não muito comum, seja em indivíduos ou coletividades, o que dá ao RTS a propriedade de estar sempre em movimento, procurando cobrir suas insuficiências e encontrar as práticas adequadas para suplantar o capitalismo em prol de sua visão de sociedade ecológica, comunista e libertária. O RTS inglês foi inicialmente o principal impulsionador na Europa, e talvez no mundo, do mecanismo de coordenação de movimentos sociais chamado Ação Global dos Povos (AGP). Foi também ele um dos grandes impulsionadores dos primeiros Dias de Ação Global.
É notório que os avanços sociais, mesmo as reformas, são sempre conseguidos devido à ação das massas, pela pressão da revolta,
A questão que se coloca é por que sempre foi preciso a “agitação das massas” para que os donos do poder cedam, para que sintam alguma ameaça” traz um medo ao status quo causando-lhe uma pressão que a expressão verbal, entre outras, não causa?
Foucault salientava que a disciplina que mantém e define um determinado ordenado social é uma técnica de operação sobre os corpos de modo a obter um resultado concreto. A disciplina dos corpos exprime a estabilidade de um sistema. Uma sala de aula só “funciona” porque os corpos dos alunos, isto é, os alunos, estão disciplinados a se disporem de uma determinada maneira. E assim é em todos os espaço-tempos na sociedade, de um teatro, passando por um exército, um show de rock ou a locomoção pelas ruas.
A disciplina do corpo em um determinado espaço-tempo, ordenado sob uma disciplina específica, pode levar o sujeito muitas vezes à prisão ou ao hospício. O “delito” e a “loucura” são algumas das criações que a nossa sociedade reservou para os corpos indisciplinado
AGP E O INÍCIO DOS DIAS DE AÇÃO GLOBAL
AÇÃO GLOBAL DOS POVOS
Em 1996, os zapatistas, mesmo temendo que ninguém aparecesse, lançaram um chamado para um encontro internacional de ativistas e intelectuais em Chiapas, com o intuito de se discutir estratégias comuns, problemas e soluções. Seis mil pessoas atenderam ao chamado, e passaram dias conversando e compartilhando suas histórias de luta contra o inimigo comum: o capitalismo. A este se seguiu no ano seguinte um encontro na Espanha, onde a idéia de uma campanha global mais concreta, chamada Ação Global dos Povos, foi parida por um grupo formado por dez dos maiores e mais inovadores movimentos sociais, incluindo o Movimento Sem Terra brasileiro e o Sindicato dos Agricultores do Estado de Karnataka (KRRS), dos agricultores radicais da Índia.
Quatro “pontos de partida” foram propostos por esse grupo (que veio a ser o comitê convocador da AGP, papel que seria rotativo anualmente) na perspectiva de juntar pessoas em torno de princípios comuns. Eles eram:
“uma rejeição explícita das instituições que as multinacionais e os especuladores constituíram para tomar o poder das pessoas, como a OMC e outros acordos de liberação do comércio (como a APEC, a EU, a NAFTA etc;”(1)
“Uma atitude de confronto, uma vez que não achamos que tentar influenciar e participar possa ter um grande impacto nessas viciadas e antidemocráticas organizações, nas quais o capital transnacional é o único e verdadeiro orientador das políticas”;
“Uma chamada para a desobediência civil não-violenta e a construção de alternativas locais, como resposta para a ação dos governos e das corporações”;(2)
“Uma filosofia organizacional baseada na descentralização e autonomia”
Em fevereiro de 1998, a Ação Global dos Povos nasceu, pela primeira vez os movimentos populares do mundo estavam começando a conversar e trocar experiências sem a mediação de Organizações Não-Governamentais, e a primeira conferência da AGP teve lugar em Genebra (Suíça). Das comunidades Uwa, passando pelos Funcionários do Correio Canadense, Reclaim The Streets, militantes antinuclear, agricultores franceses, ativistas Maori e Ogoni, sindicalistas coreanos, Rede de Mulheres Indígenas da América do Norte, aos ambientalistas ucranianos, todos estavam lá para formar “um instrumento global para comunicação e coordenação de todos aqueles que lutam contra a destruição da humanidade e do planeta pelo mercado global, enquanto constroem alternativas locais e poderes populares”.
Um dia internacional de protesto, ação e carnaval dirigido ao coração da economia global: os centros bancários e financeiros em volta do globo.
Ambientalistas, trabalhadores, desempregados, povos indígenas, sindicalistas, camponeses, redes de mulheres, sem-terras, estudantes, pacifistas e muitos outros estão trabalhando lado a lado a partir do reconhecimento de que o sistema capitalista global, baseado na exploração das pessoas e do planeta para o lucro de poucos, é a raiz de nossos problemas sociais e ecológicos. A ocupação e alteração no 18 de junho (J 18) dos distritos financeiros, simultaneamente em todo o mundo, será uma contribuição para o – e um exemplo prático do – processo de construção de conexões e alternativas à ordem social atual.
A ação esta programada para coincidir com o primeiro dia do encontro dos grupos dos Sete (G-7) dos lideres dos Estados –nação mais ricos – em Colônia na Alemanha-, quando novamente será dito pelas elites econômicas e políticas que a promoção da globalização é o único caminho a seguir.
Esta proposta é feita com o espírito de fortalecer nossas redes internacionais a partir do sucesso da ação global coordenada entre os dias 16 e 20 de maio de 1998.
Nesses dias ocorreram ações, protestos e manifestações em todos os continentes, por exemplo mais de trinta festas Reclaim The Streets em mais de vinte países – uma combinação de carnaval ilegal, protesto e ação direta, catalisado pelo RECLAIM THE STREETS em Londres. Em Brasília 50 mil desempregados e agricultores sem – terras foram às ruas, enquanto em Hyderabad 200 mil pessoas protestavam. Esses eventos coincidiram com o encontro do G-8 em Birmingham e a terceira reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio em Genebra. O ano de 1999 assistirá essas coordenações aumentarem. Paralelamente à ação global do 18 de junho, estará ocorrendo também um tour de artistas/agricultores indianos pela Europa com o objetivo de fazer campanha contra a Organização Mundial do Comércio, bancos e corporações multinacionais.
Com o espírito de fortalecer as redes internacionais pela igualdade, liberdade e sustentabilidade ecológica, encorajamos todos os movimentos e grupos simpatizantes a organizarem seus próprios protestos ou ações autônomas no mesmo dia – 18 de junho – nos mesmos locais – distritos financeiros – por todo o mundo. Cada evento seria organizado autonomamente, podendo ser coordenado em cada cidade por uma variedade de grupos e movimentos, ao mesmo tempo ligados globalmente por correio, telefone, fax, e-mail e encontros internacionais.
Greves, protestos, piquetes, ações, ocupações, festas de rua, manifestações, bloqueios, paralisações – uma unidade de diversos eventos estão sendo planejados por uma rede crescente de indivíduos, grupos, movimentos e alianças. Sua participação – não importa o quão pequena – é cruel: reuniões precisam se organizadas, eventos planejados, panfletos impressos e distribuídos, fundos levantados, risadas e idéias compartilhadas. Se cooperarmos e nos coordenarmos podemos concretizar um mundo diferente: ele por acaso já foi tão necessário e tão possível?
“Através da ação direta, as pessoas fazem conexões, conversam e se comunicam entre si, quebram o isolamento e a fragmentação desta sociedade alienada. Essas conexões estão agora se espalhando em volta do globo na medida que as pessoas percebem que suas lutas locais específicas são parte de um problema mais amplo: a economia global.”
Se seu grupo esta organizando um evento ou ação para o 18 de junho, por favor envie os detalhes para contato com seu grupo ou movimento para J18contacts@hotmail.com. Isto possibilitara que se faça uma lista global dos grupos que estão participando. Será uma fonte inestimável para todos os participantes de modo a mostrar a quantidade e diversidade de grupos em ação no 18 de junho. Esta informação será posta na pagina da Internet e na listra J18discussion.
“O colapso do mercado global seria um evento traumático com inimagináveis conseqüências. Contudo eu acho mais fácil imaginá-lo, do que a continuidade do atual regime.” (George Soros, especulador financeiro, predador e explorador.)
Imagine os distritos financeiros em todo o mundo cheios não de lucros e ganhos, mas de sons e ritmos de festa e de prazer.
Imagine substituir a ordem social existente por uma sociedade ecológica e livre baseada no apoio mútuo e na cooperação voluntária.
Imagine assumir seus desejos como realidade.
“Se você diz que a organização da sociedade e sua dominação por incontáveis tiranias, que é aquilo que ela é, é inadequada e injusta… você deve considerar quais são as alternativas e como seguir na direção delas… E estes não são problemas triviais, eles requerem movimentos populares organizados que pensem as coisas de forma total, que debatam, que ajam, que experimentem, que tentem alternativas, que desenvolvam as sementes do futuro na sociedade atual.”
O QUE FOI O DIA 18 DE JULHO?
A atividade supostamente revolucionária do ativista é uma rotina cega e estéril – uma constante repetição de poucas ações sem potencial para a mudança. Ativistas provavelmente resistiriam à mudança caso ela viesse, uma vez que ela destruiria as fáceis certezas de seu papel e o agradável pequeno nicho que eles cavaram para si mesmos. Da mesma forma que chefes de sindicatos, ativistas são eternos representantes e mediadores. Da mesma forma que lideres sindicais seriam contra o sucesso de seus trabalhadores na sua luta, porque isto provavelmente acabaria com seu emprego, o papel do ativista também é ameaçado pela mudança. De fato revolução, ou mesmo algumas mudanças reais nessa direção, desagradariam profundamente ativistas por destituí-los de seus papéis. Se todos resolvem tornar-se revolucionários, então você não é mais tão especial, não é?
Então, por que nos comportamos como ativistas? Simplesmente porque é a opção fácil dos covardes? É fácil cair no papel de ativista uma vez que ele se adapta a essa sociedade e não a desafia – ativismo é uma forma aceita de dissidência -, mesmo se como ativista fazemos coisas que não são aceitas e são ilegais. A forma de ativismo em si é da mesma espécie de um emprego – significa que ela adapta em nossa psicologia e em nossa formação. Ela causa uma certa atração precisamente porque não é revolucionária.
ISOLAMENTO
O papel de ativista é um isolamento auto-imposto de todas as pessoas nas quais deveríamos estar ligados. Incorporando o papel de ativista, você será separado do resto da raça humana como alguém especial e diferente.
Não é suficiente apenas procurar manter contato com todos os ativistas do mundo, nem é suficiente procurar transformar mais pessoas em ativistas. Contrariamente ao que algumas pessoas possam achar, não estaremos mais próximos de uma revolução se cada vez mais pessoas se tornarem ativistas. Algumas pessoas parecem ter a estranha idéia de que é preciso que todos sejam de alguma forma persuadidos a se tornarem ativistas como nós, e conseqüentemente teremos a revolução. Vaneigem diz: “A Revolução é feita todo dia, apesar de e em oposição aos especialistas da revolução”.
O militante ou ativista é um especialista em transformação social ou revolução. O especialista recruta outros para a sua pequena área de especialidade de maneira a aumentar seu próprio poder, deste modo dissipando a percepção de sua própria impotência. “O especialista… alistar a si próprio de maneira a alistar os outros”.Como num jogo de pirâmide, a hierarquia é auto- replicante – você é recrutado de maneira a ficar na base da pirâmide, e em que recrutar mais pessoas para estarem abaixo de você, que farão então exatamente o mesmo. A reprodução da sociedade alienada de papéis é efetuada através de especialistas.
Jacques Camatte, em seu ensaio “On Organization” (1969), aponta muito bem que grupos políticos muitas vezes acabam se tornando “gangues”, definindo-se por exclusão – a primeira lealdade dos membros do grupo passa a ser o próprio grupo ao invés de ser a luta. Sua crítica se aplica especialmente para a miríade dos setores de esquerda e pequenos grupos aos quais ela foi direcionada, mas se aplica em menor proporção para a mentalidade ativista.
O grupo político ou partido se auto-substitui ao proletariado, e sua própria sobrevivência e reprodução torna-se o soberano supremo – a atividade revolucionária se torna sinônimo de “construir o partido” e recrutar membros. O grupo considera a si próprio como sendo o único possuidor da verdade, e todos fora do grupo são tratados como idiotas que precisam ser educados por esta vanguarda. Ao invés de um debate igual entre camaradas, temos no lugar a separação da teoria e propaganda: o grupo possui sua própria teoria, que é quase sempre mantida em segredo, na crença de que os jogadores menos capazes mentalmente devem ser ludibriados pela organização através de alguma estratégia de populismo, antes que a política seja lançada a eles de surpresa. Este método desonesto de lidar com aqueles d fora do grupo é semelhante a um culto religioso – eles nunca lhe dirão claramente seus objetivos e pensamentos.
O capital é uma relação social entre pessoas mediada por coisas – o princípio básico da alienação é de que vivemos nossas vidas ao serviço de alguma coisa que nós mesmos criamos. Se reproduzimos esta estrutura em nome da política que se declara anticapitalista, já perdemos antes mesmo de termos começando. Não se pode lutar contra a alienação por meios alienados.
UMA PROPOSTA MODESTA.
Pode ser que em tempos de diminuição da luta, aqueles que continuam a trabalhar pela revolução social fiquem marginalizados e passem a ser vistos (e vejam a si próprios ) como um grupo especial separado das pessoas. Talvez isto só possa ser corrigido por um generalizado ressurgir da luta, quando não seremos mais pessoas esquisitas e loucas, mais simplesmente pessoas levando o que se encontra na cabeça de todos.
Historicamente, aqueles movimentos que chegaram mais perto de desestabilizar, remover, ou ir alem do capitalismo não tiveram como um todo a forma de ativismo. O ativismo é essencialmente uma forma política e um método d operar apropriado ao reformismo liberal, que tem sido empurrado além de seus próprios limites e usando para propósitos revolucionários. O próprio papel de ativista deve se constituir num problema para aqueles que desejam a revolução social.
A IDEOLOGIA DA “GLOBALIZAÇÃO”
Desde o inicio da “crise de acumulação capitalista” no fim dos anos 60, uma quantidade de termos como pós-industrialismo, sociedade de risco, pós-fordismo e é claro globalização têm sido introduzidos ostensivamente na tentativa de fornecer uma compreensão adequada das mudanças contemporâneas na economia global (Bonefeld, 1997).
Quando se focaliza a oposição nas manifestações mais recentes do capitalismo (por exemplo, a reestruturação, o mercado global, as organizações de livre comércio, o poder controlado pelas corporações multinacionais), isso significa que um ataque ao verdadeiro coração do sistema capitalista está sendo esquecido ou ignorado. O capitalismo não é um lugar (“centros financeiros”) ou uma coisa (“corporações multinacionais”), ele é uma relação social baseada no trabalho assalariado e na troca de mercadoria, de onde o lucro é derivado do roubo do trabalho não pago efetuado pelo capital. “Quarta Guerra mundial” – é entre o rico e o pobre ou entre o neoliberalismo globalizante e a “soberania nacional”.
OMC – POR QUE TOTEMIZAR A OPRESSÃO?
A polícia inglesa se defrontou com um adversário inesperado, tanto em tamanho, estrutura e tática, quanto em forma de organização. O establishment foi pego de surpresa numa manifestação de rua de tais proporções. A “caça às bruxas” não conseguiu “queimar” os líderes, uma vez que eles não existiam. Como combater dezenas de grupos de afinidades e coletivos horizontais que não possuem sede, estrutura formal etc.? Como lidar com uma manifestação multifacetada e descentralizada, com milhares de pessoas espalhadas por vários pontos da cidade?
Durante vários meses o J18 foi assunto dos jornais ingleses. As ações diretas do Animal Liberation Front e Earth First! Já incomodavam demais e o J18 foi a gota d’água. A terceira via do governo Tony Blair foi logo encontrada: uma nova lei redefinindo “terrorismo” foi elaborada após o J18. De acordo com esta lei, “destruição de propriedade” passa a ser ato terrorista, assim como “pôr em risco a vida de qualquer pessoa” (algo bastante subjetivo e aplicável a diversas formas de ação direta). Em suma, a nova Carta antiterrorismo foi elaborada para combater os movimentos sociais que utilizam a ação direta, do Animal Liberation Front ao Reclaim The Streets, e para defender as empresas e o capital de suas investidas. O terrorismo passa a ser definido não mais com o intuito de manter a estabilidade do Estado, mas também de manter a prosperidade do capital e das empresas. Qualquer expressão de apoio a um grupo considerado terrorista e a posse de qualquer objeto ou literatura associado a esses grupos ou a ações “terroristas” também passam a ser crime de acordo com a nova lei. E isso na Inglaterra, um dos berços do liberalismo, e sob o governo do Partido Trabalhista. Alguém já ouviu falar em guerra de classes? Quem a havia esquecido começou a relembrá-la depois do J18.
O QUE FOI O DIA 30 DE NOVEMBRO (1999)?
A resistência e a solidariedade são tão transnacionais quanto o capital!
RESPOSTA AO BLACK BLOCK
A resposta ao Black Block realçou algumas das contradições e despotismo intrínsecos da comunidade de “ativistas não-violentos”. À parte a óbvia hipocrisia daqueles que se engajaram em atos de violência contra pessoas que usavam máscara e que estavam vestidas de preto (muitas das quais foram acossadas apesar de não terem jamais se envolvido com a destruição de nenhuma propriedade), há o racismo de ativistas privilegiados que têm recursos econômicos para ignorar a violência perpetrada contra a maior parte da sociedade e de natureza em nome do direito de propriedade privada. A destruição de janelas e vitrines trouxe o engajamento e inspirou muitos dos membros mais oprimidos da comunidade de Seattle, mais do que qualquer boneco gigante ou fantasia de tartaruga do mar poderia conseguir (sem querer menosprezar a efetividade desses meios em outras comunidades).
SOBRE A VIOLÊNCIA DA PROPRIEDADE
A propriedade privada deveria ser distinguida da propriedade pessoal. Essa última é baseada no uso, enquanto a primeira é baseada no comércio. A premissa da propriedade pessoal é que cada um de nós possui o que precisa. A premissa da propriedade privada é que cada um de nós possui alguma coisa que outra pessoa precisa ou quer. Em uma sociedade baseada no direito de propriedade privada, aqueles que são capazes de provir mais aquilo que outros necessitam ou querem, possui mais poder. Por conseqüência, eles exercem maior controle sobre a concepção de necessidades e desejos dos outros, normalmente com o interesse de ampliar seus próprios ganhos.
Quando destruímos uma vitrine, queremos destruir o fino verniz de legitimidade que circunda o direito de propriedade privada. Ao mesmo tempo, exorcizamos o conjunto de reações violentas e destrutivas que tem se impregnado em quase tudo em nossa volta. “Destruindo” a propriedade privada, convertemos seu limitado valor de troca em um expandido valor de uso.
ENTREVISTA COM PARTICIPANTE DO BLACK BLOCK DO N30
Devemos continuar a impulsionar estratégias que desafiem o poder dos negócios e do Estado, e não que apelem a ele.
Também precisamos enraizar nossas lutas nas comunidades em que vivemos e em torno de temas relativos à opressão e injustiça, que são temas cotidianos para as pessoas em nossa volta.
SOBRE DESORGANIZAÇÃO
As atividades do RTS são resultados de esforços voluntários, não remunerados e cooperativos de várias pessoas autodirigidas tentando trabalhar juntas em igualdade. O evento buscou tanto realçar quanto confrontar diretamente o atual sistema socioeconômico internacionalizado, que causa uma enorme destruição ambiental e está levando a um aumento da pobreza e desigualdade à maioria dos povos do mundo. www.reclaimthestreets.net.
O QUE TRAZEM OS BLACK BLOCKS
A ação dos Black Blocks se inscrevem de fato numa superação do modos de manifestação política tradicionais caracterizados pelo lobby e reformismo. Os Block Blocks praticam uma desobediência civil ativa e a ação direta, afastando assim a política do teatro virtual perfeitamente domesticado, dentro do qual ela permanece muitas vezes encerrada (quando a contestação do sistema se torna um elemento entre outros no tabuleiro de xadrez político, previsível e integrado nos cálculos políticos). Os black Blocks reinserem a ação no seio da contestação e possibilitam assim um assalto direto sobre os elementos do sistema que eles rejeitam. Concretamente, os Black Blocks não se contentam com simples desfiles contestatários, certamente importantes pela sua carga simbólica mas capazes de verdadeiramente sacudir a ordem das coisas. A ação dos Black Blocks contribui para realizar a política ao invés de somente expressá-la em palavras. Neste sentido, ação política, passiva e/ ou simbólica, torna-se ativa e até ofensiva.
A “VIOLÊNCIA CONTRA A PROPRIEDADE”
“ Em um sistema baseado na busca do lucro, a ação é mais eficaz quando ataca o bolso dos opressores. A destruição da propriedade, como forma estratégica de ação direta, é uma estratégia eficaz para atingir esse objetivo. Isso não é uma teoria… é um fato” (Comunicado do Black Block Anti-Estatista, Filadélfia, 9 de outubro de 2000).
Atacar a propriedade de empresas é, antes de mais nada, romper com as clássicas manifestações-desfile que “o poder” assimila perfeitamente. Causar danos materiais que se contabilizam em dólares é dizer claramente às pessoas que falam apenas a língua do dinheiro que eles não são intocáveis, é sabotar um centésimo de seus lucros e lhes retribuir um milésimo da violência que suas atividades geram.
Se essas ações permitem afetar a imagem das companhias que são alvo, elas permitem também transformar as percepções, modificando o valor concebido aos diversos bibelôs e símbolos do capitalismo.
Uma loja pilhada é uma coletividade que toma aquela de que necessita, seja lá onde se encontrem, curto-circuitando o processo mercantil, negando o valor de troca dos objetos e lhes reconhecendo um valor de uso. É a afirmação da gratuidade contra o comércio, do roubo como forma de protesto político e meio de viver decentemente em um mundo onde nada é acessível sem dinheiro, nem mesmo a satisfação de suas necessidades vitais. O impacto visual de um slogan escrito em um muro às pândegas rivaliza com a dos painéis publicitários, do cartaz oficial ou da tela da televisão que se impõem como os únicos meios de informação e de expressão. Ele curto-circuita também o processo “normal” de expressão, reservado àqueles e àquelas que podem ter acesso a eles – devido a sua posição social ou pela falta de questionamento dos fundamentos de um sistema alienante.
Esses diferentes procedimentos, simples de serem realizados, são a manifestação de um poder emanado da base, de um poder que não possa pelas estruturas oficiais para se exprimir, mas que escolhe uma forma de expressão dissidente e mais direta. Estes meios simples, diretos e ao alcance de todos são portanto logicamente mais capazes de atingir os grupos mais desfavorecidos, os grupos mais marcados pela exclusão, aqueles e aquelas que sempre foram abandonados pela política e que acabaram por abandonar a política.
Estes momentos de ação contribuem à criação momentânea de situações onde tudo parece possível, onde a ordem balança onde a cidade parece reapropriada, “liberada” em alguns pontos. Estas Zonas Autônomas Temporárias(1) são muito importantes: trata-se de toda um ação sobre o ambiente, sobre as possibilidades que deixa entrever às pessoas – o fato de que outra coisa é possível, de que a merda cotidiana não é uma fatalidade. Estes instantes de axaltação – onde o mundo todo aparece desmoronar-estão certamente deslocados em relação à realidade, que em geral restabelece logo a ordem, mas são benéficos e indispensáveis. São as pequenas ocasiões que dinamizam, dando esta impressão de que nada será mais como antes, podendo ser catalisadores de energias, pontos de partida de iniciativas, de criações e de ações.
1 Conceito criado por Hakim Bey.
ORGANIZAÇÃO HORIZONTAL, FLUIDA E EVOLUTIVA.
Uma das características dos Black Blocks é sua forma horizontal, não-hierarquica, própria para evitar a lentidão de uma gestão centralizada. Não existe chefe nem verdadeiro plano unitário, mas sim indivíduos que constituem pequenos grupos de afinidade independentes uns dos outros. Esse modos de funcionamento permite uma relativa autonomia, no lugar de uma organização global muitas vezes sufocante (e mais propícia a expressar relações de poder).
A organização em grupos de afinidade permite tomadas de decisão bem mais rápidas e igualitárias (os grupos são constituídos de uma pequena quantidade de pessoas que se conhecem), e deste modo facilmente as mudanças e evoluções instantâneas desorientam a polícia.
A POLÍTICA DAS RUAS
UMA RESPOSTA À COBERTURA NA MÍDIA DO MAYDAY_
O RTS de Londres existe na forma atual desde 1995, nascido da luta contra a construção da estrada M11 no leste de Londres. Uma das proposições declaradas era “tomar de volta aquilo que tem sido encerrado dentro da circulação capitalista, devolvendo-o para o uso coletivo como um bem comum”. Por trás desta linguagem elaborada está uma critica cortante do modo com que os espaços públicos têm sido crescentemente privatizados: obstruídos por carros privados, colonizados por propagandas, criminalizados e usados para o gozo ou protesto e roubados para o “desenvolvimento”.
O RTS de Londres utiliza a ação direta. A ação direta diz respeito à percepção da realidade, e à tomada por si próprio de uma ação concreta para transformá-la. Diz respeito ao trabalho coletivo para desenvolver nossos próprios problemas, fazendo o que refletidamente acharmos ser a forma correta de ação, sem considerar o que as várias “autoridades” julgam aceitável. Diz respeito à inspiração, ao aumento de potencial. Diz respeito ao pensamento e à ação de tomar, não de pedir e mendigar. Ninguém me perguntou se eu queria trabalhar 45 anos como parte de um exército mal pago para manter os ricos ricos, eles simplesmente se apropriaram. Por que eu deveria pedir meu tempo de volta?
USAR UMA CAMISETA TORNA VOCÊ UM TERRORISTA
ALCA (Área de Livre Comércio das Américas). Lembrando que a expressão “livre comércio” em capitalês significa “máximo lucro ao mais forte em detrimento do meio ambiente e das condições de sobrevivência e vida humanas dos mais fracos”,
A DESTRUIÇÃO DA MERCADORIA
Uma vez que essa sociedade capitalista, da qual as diversas reuniões da OMC, do FMI, do Banco Mundial, da ALCA são apenas as missas midiatizadas, é um espelho sem aço que projeta sem parar a imagem da sua mercadoria. Enquanto estão atrás da corrente cortina de rios de sangue e de torturas de todos os tipos, enquanto planejam a repetição da fome assassina da Somália e da Etiópia através da patente e da esterilização da produção agrícola, querem fazer acreditar que o deus dinheiro, ao qual inúmeros sacrifícios foram consentidos neste século XX inimaginavelmente sanguinário, nos conduzirá enfim a seu paraíso de objetos, tal como os retratam as pinturas publicitárias televisuais.
Enquanto as promessas do capitalismo se resumem a um pa de tênis Nike, querem nos ocultar o sofrimento das crianças escravizadas que o produzem.
Enquanto o espetáculo da mercadoria nos promete tomates bem vermelhos e bem redondos em quantidades fabulosa, querem nos ocultar que suas frutas, manipuladas geneticamente, são completamente estéreis, tornando assim ainda mais independentes dos grandes proprietários das multinacionais agroalimentares os produtores agrícolas de todo o planeta. Embora a insolente política exterior ocidental multiplique as causas e organize as atrocidades do mundo (quem deu apoio a Pinochet, Suharto, Somoza, Noriega, Duvalier, Marcos, Mobutu e cia.???), os grandes sacerdotes que celebraram o espetáculo social do consenso pré-fabricado querem fazer crer que os anarquistas são maus e Perigosos!
O sistema capitalista, patriarcal e espetacular não funciona à base de encontros, sejam eles ministeriais ou de dignitários. O coração da sociedade espetacular-mercantil é feito de cristal, de vidros polidos que ao mesmo tempo refletem o retrato do consumidor, da consumidora, e lhes apresentam a mercadoria deificada.
O PÓS-SEATTLE
É uma questão de escolha pessoal chamar de violenta uma mulher que espanca ou mata seus estupradores para não ser estuprada. Nesse caso fica bem evidente toda a contradição desse sistema de pensamento. Deve-se reconhecer a existência da fonte inicial da violência, aquela que desencadeia nossa própria violência, já que ai reside toda a diferença. As pessoas que desencadeiam a violência concordam com o seu uso, e portanto reconhecem por antecipação que ela é justificada e justificável. Respondendo violentamente, lutamos contra pessoas que aceitam o uso desses meios. Somos forçados a empregá-los, enquanto aqueles e aquelas não o são. Eles são os únicos culpados da nossa própria violência.
RADICALIZE! CONSTRUINDO A RESISTENCIA À ALCA E AO ENCONTRO DAS AMÉRICAS
OS RADICAIS
“Groupe Anarchiste Emile-Henry”, afiliado da NEFAC (North-Eastern Anarcho-Communist Federation) em Quebéc.
O BLACK BLOCK EM QUEBÉC: UMA ANÁLISE
A MÍDIA, O ESFORÇO E A COMUNIDADE LOCAL
A propaganda promovida pelo CLAC/CASA e pelos anarquistas de Quebéc, distribuindo dezenas de milhares de jornais e panfletos, muitas vezes de porta em porta, foi bem-sucedida em conter o medo da polícia e da mídia, e certamente mudou a dinâmica do manifestante /morador local do medo para a solidariedade. Este é o exemplo mais claro de que nossas energias não deveriam, como muitos esquerdistas pequeno-burgueses pensam, ser direcionadas em manter uma “boa” relação com a mídia corporativa, mas em lutar contra ela e ao mesmo tempo desenvolver e criar laços e relações com as pessoas, além de reforçar nossos próprios projetos de mídia.
CONTRA A CRIMINALIDADE DO BLACK BLOCK
Tute Bianche de Bolonha e o coletivo Wu Ming (3)
3 Wu Ming é um laboratório d design literário, gerido por um coletivo de agitadores da escrita, que se constituiu como uma empresa independente de “serviços narrativos”. Os fundadores de Wu Ming são Roberto Bui, Giovanni Cattabriga, Lucca Di Meo, Federico Guglielmi (membros do Luther Blissett Project no qüinqüênio 1994-99 e autores do romance Q, a ser lançado pela Conrad Editora) e Riccardo Pedrini (autor do romance Libera Baku Ora), todavia os nomes anagráficos pouca importância têm, tanto que em mandarim Wu-ming significa “nenhum nome”. (N.T.)
NÃO NOS SALVEMOS À CUSTA DO BLACK BLOCK
UMA ENTREVISTA COM USUÁRIOS DE BLACK BLOCK
P: De onde surgiu o nome Black Block? Podemos falar de uma organização ou é um movimento autônomo?
BB: É verdade que o Block se originou de uma experiência ocorrida na Alemanha, nos anos 80, quando uma boa parte da esquerda radical autônoma alemã se vestia desta forma… de preto, e levavam capuzes e máscaras pretas para os enfrentamentos com a polícia. Era o desejo de participar de uma cultura política, ou talvez uma subcultura. Nunca existiu o Black Block como organização. Ali convergiram pessoas de diversos países que se uniram com a idéia de atacar a Zona Vermelha como repúdio à globalização do capitalismo e ao próprio capitalismo.
EXPLICAÇÃO DA MOTIVAÇÃO DO BLOCO NEGRO / ANARQUISTA
Uma vez que o movimento anarquista é um movimento antiautoritário constituído por livres pensadores, eu, é claro, somente falo por mim mesmo, mas acredito que muitos pensam a mesma coisa.
NOVA CHAMADA À AÇÃO DA CONVERGÊNCIA ANTICAPITALISTA
A Convergência Anticapitalista (ACC) está dando continuidade à nossa mobilização em Washington D.C. de 24 de setembro a 1º de outubro. Estamos chamando uma passeata contra a guerra capitalista que cresce, no sábado pela manhã, 29 de setembro, e convidamos todos aqueles interessados em criar um mundo livre de terror, ódio racismo, pobreza e guerra a manifestarem nossa unidade e visão de um mundo melhor.
(…)
Assim como a maioria das pessoas, ficamos chocados com os eventos do dia 11 de setembro. (…) A grandiosidade desta crise afetou todos nós. O Banco Mundial e o FMI cancelaram seus encontros e muitos grupos cancelaram seus encontros e muitos grupos cancelaram suas manifestações e eventos.
(…)
O governo dos EUA não consegue reconhecer a interligação de todas as formas de violência. Explosão de bombas, o apoio a ditaduras, trabalhos semi-escravos que trazem lucro para as corporações dos EUA, a dívida do terceiro mundo, a fome no mundo e a falta de abrigo e de assistência médica são elas todas formas de violência. O medo e o desespero que crescem da pobreza e da opressão são fundamentais para se compreender a violência no mundo. Trinta e cinco mil pessoas morrem de fome por dia embora existia comida suficiente para alimentar todas. O terror é sempre terror, quer ele venha da morte pela fome, do medo da escravidão pelas corporações ou do medo de bombas e aviões que caem. Enquanto não compreendermos a violência das nossas políticas exteriores, econômicas e militares, continuaremos a alimentar as condições que tornam este tipo de terrorismo possível.
No sábado de manha faremos uma Passeata Anticapitalista Contra o Ódio. De tarde organizaremos nossa Zona Autônoma Temporária. (…) Será uma zona sem ódio, uma zona sem guerra, e uma zona sem capitalismo. Encorajamos a todos que contribuam, seja com aula para a escola livre, oferecendo assistência médica básica, tocando percussão, trocando roupas, compartilhando conhecimentos e habilidades, fazendo uma performance, discutindo estratégias, preparando comida e muito mais!.
Notas:
1) Na III Conferência Internacional da AGP, realizada em setembro de 2001 em Cochabamba, alguns princípios da AGP, assim como o manifesto, foram modificados, dando-lhes um caráter explicitamente anticapitalista. O princípio citado passou a ser desde então: “Uma rejeição explicita do feudalismo, do capitalismo r do imperialismo; de todos os acordos, instituições e governos que promovem a globalização destrutiva”. (N.T.)
2) Após a III Conferência da AGP este principio foi modificado e passou a ser: “Uma chamada à ação direta e desobediência civil, ao apoio às lutas dos movimentos sociais, propondo formas de resistência que maximizem o respeito pela vida e pelos direitos dos povos oprimidos, assim como pela construção de alternativas locais ao capitalismo global”. Foi retirado o termo “não-violenta”, uma vez que dizia respeito muito mais a uma cultura de ativismo influenciada por Gandhi e quase exclusivamente presente no Norte, também devido às diferentes concepções de “não-violência” existentes em diferentes regiões, e para evitar uma divisão no movimento e criminalização de uma parte dele com base na dicotomia violência / Não-violência.(N.T.)
Twyford Down – Região em Hampshire, Inglaterra, conhecida por sua beleza natural e por guardar resquícios de épocas pré-históricas e civilizações antigas, como as trilhas antigas conhecidas como Dongas. O projeto de construção de uma estrada que destruiria Twyford Down marcou o início do movimento anti-estradas na Inglaterra, em 1992. (N.T)
Quarta Amarela – Quarta Amarela foi como ficou conhecido o dia 9 de dezembro de 1992, devido à violenta expulsão da Tribo de Dongas, que ocupava o Twyford Down em protesto contra a construção da estrada. A expulsão foi feita por seguranças privados que usavam jaquetas amarelas. (N.T)
Tribo de Dongas – Nome pelo qual ficou conhecido um grupo de pessoas que faziam uso da ação direta para defender o Twyford Down contra a construção da estrada. O nome foi retirado das antigas existentes em Twyford Down formadas ao longo de militares de anos. (N.T)
ramblers – Movimento existente na Europa normalmente caracterizado como ecológico, que visa promover o respeito pela vida, a preservação da natureza e encorajar caminhadas, sendo este último item o que dá a característica específica do movimento e de onde vem o seu nome.(N.T)
Festas Reclaim The Streets: O termo aqui se refere a uma mistura de carnaval e raves politizadas que ocupam ruas.
(Estes são apontamentos de leitura retirados do livro Urgência das Ruas – Black Block, Reclaim The Streets e os Dias de Ação Global, organizado por Ned Ludd e publicado pela Editora Conrad em sua série Baderna)
Um comentário
gaoto infernal
muita resistencia
eu temto ser um punk…numca vi um movimento anarquista tão forte parabéms tem comoser um de vc’s semdo uma pessoa só?