Crônica do Crítico Literário
Comece dizendo que o autor foge do hiper-realismo. Que mantém uma escrita sóbria sem concessões ao coloquialismo excessivo.
Siga afirmando que não usa linguagem chula nem escatológica, tão comum em nossos dias que está prestes a formar uma nova corrente.
Diga que é um representante legítimo do ideário contemporâneo. Se escreve textos curtos, diga que são fortes porque concisos. Se os textos são longos, diga que são fortes porque se esmeram em detalhes.
Lembre o leitor que (não) há nuances de experimentalismo.
Se for um contista, diga que os contos de Fulano de Tal invadem a realidade, recriando-a num espelho de múltiplas faces.
Em caso de romances, afirme que nos textos do autor, o leitor é convidado a participar, quer seja pela ambigüidade intencional do discurso ou pelo “subtexto tramado com perícia”, acentuando que esses são “reflexos óbvios da prática do conto” (se o autor não for conhecido por seu trabalho como contista, suprima este trecho ou insinue que o mesmo tem um manancial de contos guardados em suas gavetas).
Se possível identifique algum cacófato e o enumere.
Refira que o autor usa (evita) doses maciças de humor, privilegiando o trocadilho, a metalinguagem e a paródia.
Para concluir, diga que o autor consegue com primor evitar filigranas e pirotecnias, usando adequadamente a força intrínseca das palavras. Termine com “O escritor Fulano de Tal mostra, assim, consciência de seus instrumentos de criação, mantendo a coerência durante toda sua obra”.
Na próxima crítica, ajuste o nome da obra e do autor, inverta a ordem de aparecimento das sentenças e dê uma enfeitada aqui e acolá com passagens da obra e pronto: mais uma crítica literária fresquinha estará saindo do forno!