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Diálogos com Deus

Esta série começou da idéia de escrever um livro sobre a morte de Deus. Bem, para saber como (e de quê) Deus poderia ter morrido, resolvi fazer esta ¿oficina¿ com alguns trechos do meu personagem fictício. O livro segue, por trás das cortinas, seu gradual avançar em direção à existência.

Vou chamar esta série de Diálogos com Deus. Inicialmente, a série contará com quatro personagens, Deus, o vendedor de suco, Maria (mãe de Jesus) e Jesus (filho de Deus). É claro que, durante o andar da carruagem estes personagens poderão se multiplicar, pois o céu é o limite (ou não!).

Qualquer semelhança com fatos da vida real será uma semelhança com fatos da vida real, já que nestes curtos diálogos, Deus apresenta-se quase como uma pessoa comum, apresentando inclusive sentimentos humanos como impaciência, irritabilidade, fome, cansaço e até mesmo dor.

Chega de introdução e vamos ao primeiro diálogo da série.

Da série: Diálogos com Deus – Deus e o vendedor de suco

– E aí, meu Rei, votaste no Lula nas últimas eleições?

– Bem, meu filho, como senhor de todos, não posso ter um posicionamento político específico…

– Mas fala a verdade aí, meu Rei… Ce é de esquerda ou direita?

– Filho, a bem da verdade minha posição fica um pouquinho mais em cima, no centro. Quem senta ao meu lado, na direita, é Jesus, meu filho. Da esquerda mesmo é a Maria, mãe de Jesus…

– Certo… E como vocês fazem numa casa assim, com tantas divergências político partidárias?

– Hum… (já ficando irritado…) Não estou falando de política homem, estou falando das disposições das cadeiras lá em casa!

– Pois eu votei no Lula – não se dando conta do semblante quase agressivo de Deus – e, até agora, nada mudou pra mim. Dizem no noticiário que na verdade aquele lá é um sósia do Lula, que o Pessoal do PFL e do PMDB colocaram no governo depois que perderam as eleições. Será que pode, seu Deus?

– Olha meu filho, o papo tá muito bom mas eu tenho que ir trabalhar… Será que pode me ver logo esse suco de laranja ou vai demorar muito?

– -Ah é! Seu suco… Só um pouquinho que eu vou ver se tem laranja!

Acróstico

Abaixo transcrevo um acróstico feito com o meu nome, gentilmente escrito pela dona Maria Zilda, moradora do Centro Geriátrico em que trabalho. Dona Maria Zilda é poetisa de mão cheia, tendo participado de vários concursos e até vencido alguns!

Segue o belo acróstico escrito pela digníssima Maria Zilda:

“Acróstico”

R afael é nome de um anjo de “Cura”

A ssim também Rafael, médico,

F ormado em endocrinologia

A ssumindo condignamente

E sta profissão quasi divina,

L idando com seus clientes carinhosamente.

L eva consigo um ar de paz.

U ma luz forte ilumina seu caminho;

I ndo ao encontro de quem dele precisa,

Zeloso à profissão abraçada.

R ege serenamente sua vida;

E ndocrinologista competente,

I sto sei porque já ouvi dizer.

N ada acontece por acaso, este amigo chegará ao topo…

E assim termino o acróstico

H omenageando o homem de estampa, alma e profissão bonitas.

“R aphael” nome bíblico, abençoado por Deus.

Maria Zilda Perla

14.01.2004

Rubem Alves e o ritual antropofágico

Segue abaixo um extrato do site de Rubem Alves, que conheci dias atrás em uma entrevista dada para um programa da TV Cultura, patrocinado pelo Itaú Cultural.

Encontramos o texto abaixo no línque ¿Uma advertência preliminar antes de entrar na minha casa¿. Depois de ver a entrevista (com a qual fiquei encantado pelo “grau de humanidade” de Rubem) e vasculhar seu site, acabei comprando três de seus livros em uma livraria na cidade de Taquara, que também conheci esta semana e achei bem interessante: “Transparências da eternidade“, “O amor que acende a lua” e “As cores do crepúsculo – A estética do envelhecer“.

Assim que for devorando os livros, prometo extrair excertos e comentá-los aqui no Escrever Por Escrever. Aí vai a “advertência preliminar” do site de Rubem Alves:

“O que preparei para você foi um ritual antropofágico.

Antropofagia é comer carne humana – coisa selvagem. Mas os chamados selvagens não pensam assim. Uma tribo de índios brasileira que pratica a antropofagia assim se justifica: “Vocês, que se dizem civilizados, não amam os seus mortos. Fazem buracos profundos e os enterram, para serem comidos pelos vermes. Nós, ao contrário, amamos os nossos mortos. Não queremos que eles estejam mortos. Mas eles estão mortos! Só existe uma forma de mantê-los vivos: se nós os comermos. Se nós os comermos, sua carne e o seu sangue continuarão vivos nos nossos próprios corpos.” A antropofagia não se faz por razões alimentares. Não se trata de um churrasco. É um cerimonial mágico. Acredita-se que, ao comer o morto, as suas virtudes são incorporadas naqueles que o comem. A psicanálise concorda. Ela acredita que nossa personalidade é formada por sucessivas refeições antropofágicas, nas quais devoramos um pedaço de um, um pedaço de outro. Claro, ela não usa a palavra “antropofagia”. Usa a palavra “introjeção”, que significa “colocar dentro”. Mas “colocar dentro” é, precisamente, comer. A eucaristia é um ritual poético antropofágico: “Esse pão é o meu corpo: comei. Esse vinho é o meu sangue:bebei.” O escritor mineiro Murilo Mendes, no seu livro A hora do serrote, diz algo mais ouo menos assim: “No tempo em que eu não era antropófago – no tempo em que eu não devorava livros – pois os livros não são feitos com a carne e o sangue dos que escrevem?” Há livros que são lidos e o seu conteúdo não passa da cabeça. Informações. Ciência. Há outros livros, entretanto, que são comidos, vão direto para as entranhas, coração. Saber “de cor” = saber com o coração. Nietzsche dizia amar somente os livros escritos com sangue. E Guimarães Rosa, que se dizia mágico e feiticeiro da palavra, esclarecia que na sua literatura se encontrava a “alquimia do sangue do coração humano”. Pois é isso que eu desejo: ser comido. As coisas que você vai encontrar na minha casa são pedaços de mim. Não importa que seja livros, jardins, poemas, restaurante, fotos, músicas: todos são pedaços arrancados de mim. Como disse, o objetivo da antropofagia não é gastronômico, é mágico: fazer com que o o corpo do que come fique parecido com o corpo do que é comido. É isso que eu quero. De forma especial, desejo que você veja da forma como eu vejo. Gostaria de dar-lhe os meus olhos. Se você vir como eu vejo, então não percisarei mais falar e escrever… Nos sonhos frequentemente a casa simboliza o corpo. Minha casa não é para ser visitada. É para ser comida. Bom apetite! Volte sempre. Rubem Alves ”

Próximos pôusts: “Resenha do livro Memórias de um anarquista japonês, de Osugi Sakae”; “Excertos e comentários do livro Transparências da eternidade, de Rubem Alves”; “Da série: Diálogos com Deus – Deus e o ateu”

Rafael Reinehr é médico endocrinologista, anarquista, escritor, permacultor, ativista oikos-socio-ambiental e polímata ma non troppo.

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