A Sociedade em Rede e a Medicina
“Estamos nós, que vivemos no presente, condenados a nunca experimentar a autonomia, nunca pisarmos, nem que seja por um momento sequer, num pedaço de terra governado apenas pela liberdade? Estamos reduzidos a sentir nostalgia pelo passado, ou pelo futuro? Devemos esperar até que o mundo inteiro esteja livre do controle político para que pelo menos um de nós possa afirmar que sabe o que é ser livre? Tanto a lógica quanto a emoção condenam tal suposição. (…) Acredito que, dando conseqüência ao que aprendemos com histórias sobre “ilhas na rede”, tanto do passado quanto do futuro, possamos coletar evidências suficientes para sugerir que um certo “enclave livre” não é apenas possível nos dias de hoje, mas é também real. Toda minha pesquisa e minhas especulações cristalizaram-se em torno do conceito de Zona Autônoma Temporária.”
– Hakim Bey
Finalmente, estamos no alvorecer de uma sociedade que, como nunca antes, conecta-se intensamente e amplamente, gerando a possibilidade de produzir respostas derivadas não mais da inteligência de um ou outro comandante supremo mas sim respostas derivadas de um computador ainda não experimentado adequadamente mas que já dá seus primeiros passos que é o da inteligência coletiva.
Em momentos como estes, em que barreiras são quebradas a cada novo dia, não irão tardar a surgir algoritmos capazes de competir com nossos melhores internistas no diagnóstico de patologias; já se vislumbram no horizonte websites nos quais pacientes reúnem-se para comentar favorável – ou desfavoravelmente – sobre seus médicos; a democratização do conhecimento – que começou com a democratização da cultura (downloads de músicas, de filmes, de livros) irá avançar para a democratização das possibilidades de acesso ao conhecimento médico e cada vez mais pessoas serão capazes de se automedicar de forma eficiente.
Enquanto hoje tudo isto pode parecer uma aberração aos olhos do médico tradicional – quanto mais aos Conselhos que nos regem e Sindicatos que nos defendem – tais possibilidades estão abertas e nada mais representam um desejo vivo de liberdades de escolha cada vez mais salientes, incutidas pela indústria e pela propaganda na sociedade do consumo.
E será que esta liberdade é tão ruim assim? Será que quebrar o monopólio médico sobre a saúde das pessoas e o monopólio dos Hospitais sobre o local de nascimento e morte dos indivíduos é algo assim tão devastador? Ivan Illich, em seu Medical Nemesis (também conhecido como Limites da Medicina), achava que não. Desde a década de 70 Illich já criticava o fato da Medicina transformar os pacientes em “clientes para toda vida”, ao invés de ajudar a capacitar as pessoas a cuidarem de si mesmas.
Pessoalmente, enquanto vigorar a tendência da sociedade industrial de invadir os consultórios médicos, criando máquinas de atender ao invés de seres humanos preocupados genuinamente com outros humanos, não me preocupo se as máquinas de verdade passarem a substituir o homem-máquina.
Precisamos dar um passo atrás.
“(…) O fato é que vivemos uma intensa luta nos dias de hoje. É um desafio permanecermos humanos em um mundo que viaja a velocidades supra-humanas. Estamos – poucos percebem – nos tornando máquinas. Máquinas de trabalhar. Não queremos ser sustituídos, então, temos que mostrar trabalho.
Me corrija se eu estiver errado. (…)
Precisamos humanizar o homem-máquina.” – Rafael Reinehr