Diego Abad de Santillán – A Alforria Final – Os objetivos da revolução social libertária
Estamos vivendo em plena decomposição geral de valores, em plena crise de instituições e de sistemas. Nada resiste à picareta demolidora dos tempos, e muito mais do que a crítica certeira e racional dos pensadores fizeram, nos últimos anos, os próprios acontecimentos em sua eloqüência grandiosa e brutal.
É deplorável o espetáculo que nos oferecem certos povos que entranham possibilidades criadoras tão grandes e que, entretanto, se ajoelham submissos implorando um chefe, um caudilho, ou seguem alvoroçados os que lhe prometem rematar mais firmemente as algemas da escravidão.
Os povos não têm confiança em si mesmos; não é culpa sua, está claro, mas daqueles que há séculos se tem esforçado por minar essa confiança em a educação religiosa, monárquica, marxista.
Diego Abad de Santillán é o pseudônimo de Sinesio Vaudilio García Fernández. Nasceu em 20/05/1897 em Reyero, província de Leon (Espanha). Aos oito anos de idade emigrou com seus pais, Donato García Paniagüa y Angela Fernández à Argentina.
Em 1912 voltou à Espanha estudou Filosofia e Letras na Universidade de Madrid. Foi preso por um ano e meio devido a sua participação na greve geral de 1917. Posto em liberdade voltou à Argentina, onde foi membro ativo da anarcosindicalista Federación Obrera Regional Argentina (FORA) e redator de seu periódico La Protesta de Buenos Aires. Em 1922 representou FORA na fundação da Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT) em Berlim, onde estudou medicina. Conheceu ali destacados anarquistas como Max Nettlau e Elise Kater, filha do editor Fritz Kater. Em 1926 saiu da Alemanha sem terminar seus estudos. Acompanhou a Confederação General de Trabalhadores (CGT) no México e regressou à Argentina. Em Buenos Aires foi de novo redator de La Protesta e dirigiu o periódico La Antorcha. Em 1930 foi condenado à morte por tentativa de sedição contra o Estado. Escapou para o Uruguai. Quando se proclamou a República espanhola em 1931 marchou para a Espanha, mas voltou à Argentina, onde viveu na clandestinidade produzindo várias obras. No final de 1933 regressou à Espanha e se instalou em Barcelona.
Ali exerceu um papel importante na Federação Anarquista Ibérica (FAI) e foi o secretário do Comitê Peninsular em 1935. Foi redator da revista Solidaridad Obrera, dirigiu a revista Tierra y Libertad e fundou Tiempos Nuevos em 1934. Depois de terminado o levante militar em Barcelona em julho de 1936, tomou parte na organização das milícias na Catalunha como membro do Comitê de Milícias Antifascistas. Em dezembro de 1936 foi nomeado Ministro da Economia da Catalunha. Em 1939, pouco antes da queda de Barcelona, refugiou-se na França e voltou à Argentina. Viveu novamente clandestinamente e de 1977 até sua morte em 18 de outubro de 1983 viveu em Barcelona.
Os anarquistas e o momento atual do mundo
Estamos vivendo em plena decomposição geral de valores, em plena crise de instituições e de sistemas. Nada resiste à picareta demolidora dos tempos, e muito mais do que a crítica certeira e racional dos pensadores fizeram, nos últimos anos, os próprios acontecimentos em sua eloqüência grandiosa e brutal.
É deplorável o espetáculo que nos oferecem certos povos que entranham possibilidades criadoras tão grandes e que, entretanto, se ajoelham submissos implorando um chefe, um caudilho, ou seguem alvoroçados os que lhe prometem rematar mais firmemente as algemas da escravidão.
Os povos não têm confiança em si mesmos; não é culpa sua, está claro, mas daqueles que há séculos se tem esforçado por minar essa confiança em a educação religiosa, monárquica, marxista.
A revolução de 1917 na Rússia despertou, em todo o mundo, em poucos meses, em milhões e milhões de escravos a consciência de uma nova vida. É indescritível o júbilo com que foi saudada a queda do czarismo e a intervenção do proletariado na orientação de seus destinos. A Rússia se converteu em um símbolo para todas as forças revolucionárias.
Mas a política de Estado matou o espírito socialista e ao cabo de poucos anos aquele grande país deixou de ser um símbolo de libertação para converter-se em um ideal de burocratas. Hoje é uma potência imperialista junto a outras potências imperialistas, que prepara a guerra como todos os Estados, que tem tão pouco que ver com o socialismo e com as idéias do proletariado como qualquer outro Estado.
A política de Estado e o socialismo harmonizam tão pouco como a água e o fogo. Não se constrói o socialismo senão à medida que se destrói o Estado e se criam instituições populares da gestão direta da produção, do consumo e da reorganização social.
Desfeito o símbolo do oriente, o mito de Rússia, surgiu para as hostes progressistas, para os escravos insubmissos do mundo todo, o símbolo espanhol.
Deixando de parte o ambiente criado na Espanha pela consciência revolucionária, e generalizando os nossos conceitos, devemos constatar, entretanto, esta verdade: enquanto a Rússia prepara o seu milhão de soldados para lutar ao lado do capitalismo francês na próxima guerra, a Espanha, pelo seu ambiente revolucionário anarquista, se prepara para levantar a voz e declarar a paz ao mundo, como resposta solene à corrida armamentista e à carreira desabalada para a degeneração em que competem os modernos estados.
O estado totalitário é a idéia da autoridade levada a sua máxima expressão. Tem necessidade de fortificar as suas instituições, de reforçar o seu militarismo, a sua burocracia, as suas polícias, e só esse fato, que encarece horrivelmente as cargas tributárias, é o melhor argumento para predizer o seu fracasso.
Um dos males básicos das sociedades contemporâneas é a carga formidável do parasitismo fiscal. O Estado moderno é insuportável, não só porque é tirânico, mas sobretudo porque é excessivamente caro e porque as suas funções essenciais são obstáculos ao bom desenvolvimento social.
Com o capitalismo privado ou com o capitalismo de Estado morre-se de fome junto aos celeiros repletos, tirita-se de frio junto às lojas abarrotadas de agasalhos.
Reorganização econômica e social
Se queremos salvar-nos temos que procurar a salvação em uma transformação radical, econômica e social, de forma que os lugares de trabalhos sejam abertos a todos os que desejam trabalhar, que as barreiras que impedem o livre câmbio dos valores produtivos, intelectuais e artísticos sejam suprimidos para sempre, que se restabeleça o equilíbrio inevitável entre os meios de que dispomos para viver melhor para todos.
Todos têm o mesmo interesse básico: adquirir a posse do produto do seu trabalho.
Abrigamos a firme convicção de que o mundo será feliz somente quando seja livre, quando haja extirpado de seus seio, das suas instituições, das duas idéias a dominação e a exploração do homem pelo homem.
Tomamos o nome de anarquistas ou libertários, porque somos inimigos do Estado, isto é do conjunto de instituições políticas que têm por fim impor, a todos , os seus interesses e a sua vontade mascarada ou não com a vontade popular.
Somos, pois, anarquistas, porque queremos uma sociedade sem governo – uma organização social livre, constituída do indivíduo ao grupo, do grupo à Federação, com desprezo de barreiras e fronteiras, sendo a associação baseada sobre o livre acordo e naturalmente determinada e regulada pelas necessidades, aptidões, idéias, e sentimentos dos indivíduos.
Concepção integral, o anarquismo tem um método próprio de ação, baseado na livre iniciativa e na solidariedade.
Os “poderes públicos” cedem apenas as liberdades que são tomadas. A lei é inútil, quando não é nociva; fica letra morta, quando registra uma liberdade, se o povo não a defende e usa.